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Há um bom livro sobre isto. O cinema que transcende.
Depois da segunda grande guerra os realizadores entenderam que tinha de haver algo mais para lá da narrativa. A catadupa de acontecimentos não preenche o afago humano de modo completo, nem satisfaz as necessidades de transcendência que a vida moderna impõe.
Era preciso homenagear o tempo e a vida, pelo seu valor intrínseco, o preço justo de existirem. Ficámos com Dreyer, Ozu, Béla Tarr, o mestre Tarkovsky, tantos outros. É como quem diz: ficámos a ganhar.
A valorização do tempo e o estudo da sua textura íntima desafiam os impulsos modernos. Obrigam-nos à permanente voragem. Vem daí o benefício analítico do cinema contemplativo, ao sentirmo-nos expostos a uma ausência de narrativa, apenas o decorrer da vida normal.
Os "road movies" de Kiarostami, no seu estilo único que lembra um neorrealismo italiano muito pálido, contêm os efeitos de uma longa viagem de comboio: a contemplação faz morder o cérebro numa tortura doce, até que se aprende a digerir o tempo na sua velocidade justa.
A transcendência não é, necessariamente, uma espiritualidade. É uma sublimação, um nevoeiro que se ergue para a seguir se condensar numa chuva bruta, profunda, essencial. A alma é uma criança que brinca entre piscinas.
Só então é que começa a viagem.
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